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Recomendações de livros sobre saúde mental
Antes de ler, verifique a lista de gatilhos.
Além de leitor, eu sou psicólogo e, de vez em quando, encontro histórias que podem nos ensinar muito sobre saúde mental. Selecionei algumas para recomendar:
“Emitindo”, de Benjamin Edgar Jacob
Conta a história de Pam, uma humana órfã adotada por erianos — uma espécie alienígena octópode e telepática que imigrou para a Terra após um desastre natural em seu planeta natal. A história começa com a Pam adulta recebendo mensagens de seu pai adotivo numa rede social semi-abandonada.
O problema é que Hélio, o pai adotivo em questão, havia se suicidado anos atrás. O caso era famoso, inclusive, pois nunca houvera antes suicídio entre os erianos.
A abordagem para adoecimento mental nesse conto é muito melhor que as campanhas usuais de Setembro Amarelo e Janeiro Branco, falo sem medo de errar. Isso porque, ao falar de depressão e suicídio, é comum que ignorem certas determinações sociais: exploração de classe, racismo, xenofobia, lgbtqfobia… Nesse conto, nada é ignorado. Além disso, podemos ver na Pam vários padrões de pensamento de uma pessoa com depressão. Compreender isso é essencial para pensar um acolhimento eficaz.
Publicado na Revista Mafagafo, Edição 3, mês de Agosto. Disponível para leitura e download gratuitos.
“Hei Hou, Borunga Chegou”, de Santiago Santos
Ainda temos o tema de suicídio, mas eu não teria coragem de chamar a situação que traz o tema à tona de depressão. Aqui a questão ganha outro ângulo.
Borunga é um navio intergaláctico e interdimensional que visita mundos momentos antes do seu fim e salvam compulsoriamente uma criança de cada mundo. O problema começa quando Kerrera é salva, alguém que não queria ser salva.
Esse é um conto que pode nos fazer pensar os limites éticos de interferir com a vida das outras pessoas. E se aquilo que chamamos de salvação é, para a outra pessoa, uma condenação?
Publicado na Revista Mafagafo, edição 3, no mês de Junho.
“O alienista”, de Machado de Assis
Claro que não poderia faltar essa obra, ícone da ironia antimanicomial. Para quem não sabe, alienistas eram estudiosos da “alienação humana”, como muitas vezes se chamavam os transtornos mentais. Eram uma espécie de psicólogos ou psiquiatras.
O humor daqui é que, cada vez que o nosso alienista chegava a uma nova conclusão sobre a psique humana, passava na Câmara de Vereadores a proposta de, compulsoriamente, internar pessoas na Casa Verde — que seria uma espécie de manicômio. Isso sai tanto do controle que logo há mais gente internada que gente considerada sã.
Daí fica o questionamento: o que é ser são? O que é ser louco? Quais são os limites dessas classificações?
Em tempos de retorno à lógica manicomial através de comunidades terapêuticas, em tempos de farras de diagnósticos psiquiátricos, a novela de Machado de Assis se faz muito atual.
Disponível em domínio público.
“Flores para Algernon”, de Daniel Keyes
Provavelmente o livro mais pesado da lista, mas também um dos meus favoritos. É uma ficção científica epistolar em que lemos os diários de Charlie, uma pessoa com deficiência intelectual severa que está participando como cobaia de um experimento para aumentar a inteligência humana.
Os registros dele saem da condição de déficit intelectual para um superávit, praticamente a pessoa mais inteligente viva. Mas o foco não é especular apenas como é se tornar um gênio. O interessante é como Charlie se sente em cada etapa do processo e como as pessoas o tratam.
É o melhor livro que conheço para pensar a neurodivergência. Claro que se trata de uma ficção científica. Não é possível forçar uma alteração do neurodesenvolvimento em adultos — e algo do tipo seria extremamente antiético. Mas acompanhamos Charlie passar por vários estágios de alterações de funcionamento cerebral, expressos em seu psiquismo, que tem impactos sociais.
Eu recomendo uma leitura focada na forma como as pessoas tratam Charlie e em como ele se sente. Fica um outro questionamento: os prejuízos para a pessoa neurodivergente vêm da condição dela ou da vivência em uma sociedade intolerante?
O e-book está disponível na Amazon, gratuito para assinantes do Kindle Unlimited.
E por hoje ficamos assim. Agora deixem-me saber: gostaram das indicações? Se vocês acharem que faltou alguma história na lista, compartilhe nos comentários.
Ícaro de Brito, serial reader, escritor de romance, fantasia e ficção cientifica, violinista amador, marxista-leninista, é idealizador do Guia para Estudar Escrita Criativa na Internet e psicólogo nas horas vagas. Escreve ocasionalmente no blog Rascunhos Abertos e tem dois contos publicados na Faísca, você pode ler um, e ouvir o outro no podcast Assovio. |
Revisão: Denize Gaspar
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