5 livros de vampiros pelo ponto de vista dos vampiros

Antes de ler, verifique se você tem reflexo no espelho e veja como se sente sobre pão de alho.

Eu sinto uma sede insaciável e acabo matando pessoas para sobreviver. Estou condenado à danação eterna e não sei se vale a pena continuar tentando ser uma boa pessoa. Eu não pedi por essa vida e não sei as regras. Eu sou o imortal mais fraco da cadeia alimentar e não sei se a imortalidade compensa todo esse abuso. Eu sou o imortal mais forte da cadeia alimentar e estou entediado da minha existência eterna. Todas as pessoas que eu amava morreram. Eu não sei como me aproximar do meu amor de outra vida que reencarnou.

Esses são apenas alguns dos conflitos de livros onde os vampiros são protagonistas. Livros de vampiros com protagonistas humanos tem outros conflitos, como “oh, por que será que todas as criadas dessa senhora muito velha e muito rica adquirem anemia e morrem? Que mistério! Nunca saberemos.” ou “PQP, quantos tiros eu tenho que dar nessa desgraça pra ela morrer???”. Esses podem ser legais também, mas a minha criança interior dramática e introspectiva nunca conseguiu resistir aos vampiros emos reflexivos. Tanto que eu escrevo sobre eles até hoje — a segunda temporada da minha novela de vampiros começou ontem na newsletter!

Assim sendo, hoje trago uma lista de cinco livros de vampiros onde nossos sanguessugas favoritos são heróis (ok, talvez nem tanto) trágicos incompreendidos — ou pelo menos pessoas com personalidades e motivações reais, não apenas o monstro da semana que precisa ser derrotado.

Capa ilustrada mostrando dois rapazes de costas sentados no que parecem ser poltronas de cinema. Um deles olha pra frente e só vemos seu cabelo cacheado, mas o outro está de lado com o braço passado por trás do primeiro. Esse é um jovem negro com a parte um corte de cabelo que é alto em cima e raspado em baixo. No título "Sessão de cinema para vampiros" a palavras "vampiros" está numa fonte que parece sangue escorrendo.

Começo minha lista com esse conto porque acho ele educativo: a trama revolve ao redor de Davi, que foi transformado por acidente e não tem nenhuma informação sobre sua condição de vampiro. Ao conhecer Antônio, os dois decidem assistir a todos os filmes de vampiro que conhecem para tentar ajudar Davi a descobrir como isso funciona. Eu não sou uma pessoa do cinema, então achei legal conhecer tantos filmes sobre o assunto. O conto todo é muito fofo, e outro ponto positivo é que ele oferece sua própria explicação — muito bem feita, por sinal — sobre como o vampirismo funciona.

Aviso aos leitores: a revisão do conto está fraquinha, então quanto mais você avança na história mais erros de digitação vão escapando.

Capa de fundo laranja com uma montagem que inclui uma jovem negra de cabelo bem cheio e usando uma blusa branca. Ela tem olhos amarelos e manchas de sangue nas mãos e rosto. /há um pássaro voando perto do rosto dela.

Fledgling, Octavia Butler

Se eu tivesse que resumir “Fledgling” em uma frase, eu ficaria em dúvida entre “vampiros de ficção científica” e “a história que me lembrou por que eu amo histórias de vampiros”. A protagonista de “Fledgling” acorda com amnésia, e tudo o que ela lembra é que precisa de sangue para sobreviver. Ela conhece Wright, que propõe a solução lógica: “você é uma vampira”. Você vai aprendendo sobre o funcionamento dos vampiros nesse mundo com a protagonista, enquanto ela investiga o que raios poderia ter deixado ela tão ferida a ponto de ter amnésia.

Aqui eu  preciso admitir que eu gosto de histórias fofas, mas eu gosto mais de angústia. Não angústia de “casalzinho que se quer, mas não tem coragem de se pegar”, angústia existencial! Angústia moral!!! E uma das minhas formas preferidas de angústia é “os vampiros conseguem mexer com a sua cabeça”. Em “Fledgling”, os vampiros criam um sistema de simbiose com seus humanos. Em teoria, os humanos todos entraram nessa com consentimento. Na prática, a mordida dos vampiros deixa os humanos influenciáveis e suscetíveis à hipnose. A Shori é legal, ela realmente é… mas isso justifica o nível de controle que ela tem sobre os humanos envolvidos com ela?

E outra coisa que eu gosto demais é que, quando a Shori descobre quem tentou matá-la, os vampiros convocam os culpados para um julgamento. Além da tensão pra saber se eles vão conseguir se safar ou não, eu acho isso importante porque pode até ser satisfatório ver a heroína sofredora se vingar, mas eu acho muito mais “final feliz” ver a comunidade reconhecer as fraquezas que permitiram essa situação existir, responsabilizar os culpados e tomar medidas concretas para ser melhor.

Capa ilustrada com uma montagem que inclui: um fundo azul composto por teclas de um piano, título e detalhes brancos como uma clave de sol e morceguinhos voando, e duas silhuetas amarelas, a de uma menina de cabeça pra cima, e um menino de cabeça pra baixo como se estivesse andando no teto.

Noturno em Sol Maior, Adriana Rodrigues

Se você gostou da ideia de vampiros com explicações científicas e sociedades vampíricas determinadas a serem melhores, “Noturno em Sol Maior” é o seu livro. Além de ser uma das top 5 melhores capas da literatura nacional (fonte: é a minha opinião que conta), “Noturno em Sol Maior” entrega uma sociedade de criaturas da noite construída em princípios de cooperação e respeito, onde a autora realmente passou uma década pensando nos mínimos detalhes sobre quanto sangue um vampiro precisa pra sobreviver, qual velocidade um vampiro pode alcançar e como uma cidade mágica faria para ter internet.

Ainda assim, as explicações não ficaram pesadas. A história segue Cristina, uma adolescente sarcástica atormentada por enxaquecas terríveis que decide investigar o desaparecimento repentino de um amigo com quem trocava cartas. Conforme ela investiga, acaba sendo levada a revisitar eventos traumáticos, como a morte do pai e a ausência frequente do tio, e a associação desses eventos com a sociedade de vampiros de Bela Noite. Além da prosa, o livro contém trechos da Enciclopédia de Vampiros de Auguste e registros confidenciais da polícia de Bela Noite que vão iluminando aspectos da sociedade vampírica conforme Cristina vai sendo exposta a eles, ao mesmo tempo que servem de pistas para o leitor formar as próprias teorias sobre o que está acontecendo com ela.

Capa ilustrada com dois personagens usando uniformes escolares. Um está sentado com uma expressão um pouco aflita, essa pessoa usa óculos e tem cabelo castanho liso. O personagem de pé tem expressão séria, cabelo branco ondulado, olhos vermelhos, e está arrancando da parede um cartaz que parece uma caricatura de um vampiro.

My boyfriend is a vampire, Yu-ran Han

Eu ia recomendar “Vampire Knight”, que é o melhor triângulo amoroso na história dos triângulos amorosos (fonte: vozes da minha cabeça), mas a verdade é que todo mundo conhece “Vampire Knight”, então decidi jogar toda a cautela pra cima e recomendar “My boyfriend is a vampire”.

Esse manhwa é horrível. Eu não posso enfatizar isso o suficiente, é muito ruim, absolutamente não leiam. É até bom que ele não seja comercializado no Brasil.

Nota: Manhwa é o equivalente coreano do mangá.

Mas, Ana, se esse quadrinho é tão ruim, por que raios você está recomendado?

Porque eu também gosto de umas farofas questionáveis, ué. Nem tudo que a gente lê precisa ser uma obra de arte.

“My boyfriend is a vampire” começa com um garoto, Yoo Da-in, que sempre é confundido com uma garota. Dois irmãos vampiros bonitões com uma terrível rivalidade entre si aparecem, coisas acontecem, e o Da-in é transformado em vampiro. Exceto que ele vira uma garota! Genderbend traz inúmeros desdobramentos questionáveis, 

Nota: Genderbend são histórias onde ocorre inversão/troca de gênero das personagens.

e eu diria que a explicação no final torna tudo ainda pior, mas… no meio do caminho a Da-in tem a oportunidade de ser a vampira mais poderosa da coisa toda, e os irmãos vampiros mauricinhos não têm a menor chance contra ela — naquele sentido de vampiros mais fracos não conseguindo resistir aos mais fortes. Como eles são filhos do rei dos vampiros, eles definitivamente não esperavam por essa, e é absolutamente delicioso.

Capa majoritariamente preta, com metade do rosto de um homem iluminado de forma sinistra. Ele tem olhos vermelhos. Além do título em vermelho, lê-se o subtítulo "tem gente que não acredita em vampiros"

Os Sete, André Vianco

Aqui eu admito que vou trapacear um pouco, porque durante a maior parte do livro 1 os vampiros são “um monstro a ser evitado”, porém, na minha cena preferida, o vampiro Gentil conta sua história, e um dos personagens do núcleo humano é transformado. A partir daí o livro 2 mostra mais pontos de vistas dos vampiros, então acho que ainda se encaixa nessa lista.

O livro começa no Rio Grande do Sul, com dois mergulhadores amadores descobrindo sete caixões de prata numa caravela afundada. Como sempre, os cientistas ignoram os avisos de “não abra esses caixões pelo amor de Deus”, e os vampiros portugueses começam a reviver. Faz muito tempo que li, e eu reconheço que se lesse hoje provavelmente não gostaria tanto, mas foram livros muito importantes pra mim na época.

Porque o André Vianco é de Osasco, e eu sou de Osasco, minha cena favorita de “Os Sete” acontece num túnel que passava por baixo da linha do trem no centro. Como eu ficava fascinada por esse lugar quando era criança. Eu não tinha nem medo, porque eu era pequena demais e amada demais para saber que o mundo é um lugar terrível e sair por aí tendo medo das coisas, mas os adultos tinham medo daquele túnel, e eu tinha fascínio. O túnel não existe mais. Ele sobrevive nas memórias de osasquenses mais velhos e nas páginas do André Vianco.

Extra

A ficção relâmpago “Sofá”, do Waldson. Não dá pra falar muito sobre ficção relâmpago sem estragar o efeito da leitura, mas o jeito como ele descreve gente pobre rearranjando a mobília pra extravasar suas angústias realmente me pegou.

Essa é a minha listinha. Poderia ter mais coisa? Poderia. Mas eu tentei focar em livros menos conhecidos e que foram significativos para mim. Se você tiver suas próprias recomendações, deixe-as nos comentários!

Fotografia de Ana Carorina Dantas, uma mulher branca de cabelo joãozinho, usando óculos retangulares. Ela tem sobrancelhas grossas e uma trança fininha caindo sobre o ombro.

Ana Carolina Dantas é física nuclear e escreve histórias de fantasia e ficção cinetífica focadas em relacionamentos interpessoais. Ela tem alguns contos na Amazon e publica na sua newsletter uma história de vampiros. Ana gosta de RPG, assiste One Piece enquanto lava louça e aparentemente é editora-chefe da VAL (ela nega as acusações).

Revisão: Luiz Felipe Sá

Lembre-se que a seção de comentários fica aberta, e adoraríamos ouvir suas sugestões de livros de vampiro!

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